(...)
Penetra surdamente no reino das palavras
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
(...)
Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível, que lhe deres:
Trouxeste a chave?
(...)
(Carlos Drummond de Andrade)
Nesse poema, por meio da função poética, o sujeito-poemático afirma que a condição básica da atividade poética é decifrar o sentido latente das palavras. Só Drummond mesmo para definir com tanta classe o fazer poético.
ResponderEliminartem essa dele, que eu adoro:
ResponderEliminarE agora, José?
A festa acabou,
A luz apagou,
O povo sumiu,
A noite esfriou,
E agora, José?
E agora, você?
Você que é sem nome,
Que zomba dos outros,
Você que faz versos,
Que ama, protesta?
E agora, José?
Está sem mulher,
Está sem discurso,
Está sem carinho,
Já não pode beber,
Já não pode fumar,
Cuspir já não pode,
A noite esfriou,
O dia não veio,
O bonde não veio,
O riso não veio,
Não veio a utopia
E tudo acabou
E tudo fugiu
E tudo mofou,
E agora, José?
E agora, José?
Sua doce palavra,
Seu instante de febre
Sua gula e jejum,
Sua biblioteca,
Sua lavra de ouro,
Seu terno de vidro,
Sua incoerência,
Seu ódio - e agora?
Com a chave na mão,
Quer abrir a porta,
Não existe porta;
Quer morrer no mar,
Mas o mar secou;
Quer ir para Minas,
Minas não há mais
José, e agora?
Se você gritasse,
Se você gemesse,
Se você tocasse
A valsa vienense,
Se você dormisse,
Se você cansasse,
Se você morresse
Mas você não morre,
Você é duro, José!
Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato
Sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!
José, para onde?
C.D. de Andrade
Bruna, turma 103
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